Relato da Conquista da Via Amigo É Pra Essas Coisas

Discussão em 'Relatos de Viagens' iniciado por Rocha, Mar 17, 2017.

  1. Rocha

    Rocha Moderator Moderador

    Por Leandro do Carmo

    Relato dos dois dias da conquista da via

    Croqui da via

    Local: Morro das Andorinhas - Setor Casa de Pedra

    Ver mais conquistas

    Primeira Investida
    Data: 28/07/2013

    Participantes: Leandro do Carmo, Ary Carlos e Guilherme Belém
    Depois de um feriado de chuva e frio, conseguir escalar no final de semana seria uma tarefa difícil. Havia chovido bastante e tudo estava muito molhado. Já estava até desanimado, mas no sábado o tempo deu uma firmada e a previsão para o domingo era de tempo bom, pelo menos não choveria. Tive a idéia de começar um projeto que havia pensado há um tempo atrás, lá no Morro das Andorinhas. A parede é bem limpa, seca rápido. Como é um setor verde, já havia comunicado ao PESET, a minha intenção de conquista. Falei com o Ary e com o Guilherme e eles toparam na hora.

    [​IMG]
    Marcamos de sair por volta das oito da manhã. Acordei cedo e fui preparar o equipamento. Não queria esquecer nada, muito menos os grampos! Tomei um café e parti em direção à Itaipú. Nosso ponto de encontro foi na Igreja de São Sebastião. Começamos a agradável trilha até chegar ao setor Casa de Pedra. Lá, demos uma parada para organizar o equipamento e mostrei, mais ou menos a linha que havia pensado. Fomos até a base e decidimos por onde começar. Nos preparamos e comecei a subir. Segui uma leve diagonal para a direita e escolhi um local bem visível para o primeiro grampo, para que não houvesse dúvida quanto ao início da via. Quando saquei a furadeira, cadê a broca? Ficou na mochila! Avisei ao Guilherme e ao Ary do meu esquecimento eles amarraram um saquinho com as brocas. Puxei o saquinho e coloquei o primeiro grampo.

    Mais uma diagonal para a direita e mais um grampo. Os lances iniciais são bem tranquilos, sem dificuldade. Muitas agarras ainda por quebrar. Segui mais em diagonal e avistei um pequeno platô e resolvi colocar o terceiro grampo. Mais a direita, dava para ver uma parte mais limpa e vertical da parede, mas a corda não chegava lá, resolvi então que faria ali a P1 da via. Montei a parada e o Guilherme de tênis, subiu, seguido pelo Ary.

    Na parada, passei a vez para o Ary, que conquistou a segunda enfiada, resumindo assim:

    “Fiz a segunda parte da via depois que o Leandro colocou os 3 primeiros grampos, saí em horizontal até pegar uma linha limpa vertical e mais "emocionante" da via, coloquei o quarto grampo e toquei pra cima, mais ou menos na metade da corda coloquei o quinto grampo, para o caso de alguém querer descer a via de rapel e a corda alcançar a parada onde o Leandro e o Guilherme estavam. O sexto grampo, eu coloquei no meio de um lance mais vertical antes de chegar em uma parte que estava molhada, dali subi mais um pouco e cruzei para a direita da parte molhada e como a corda estava acabando coloquei o sétimo grampo e fiz a parada nele.”

    Quando o Ary montou a parada, foi minha vez de subir. O Ary tinha razão, por enquanto a melhor parte via! Depois da horizontal, segue reto para cima, com pequenas agarras e muitas ainda por quebrar. Mais acima um lance de aderência bem interessante. Cheguei na parada e o Guilherme veio logo atrás, de tênis, aos trancos e barrancos... Com todos na parada. Era a vez do Guilherme conquistar... Mas ele estava de tênis... Emprestei minha sapatilha para ele. - Amigo é para essas coisas!!! - falamos na hora. Mas não seria assim tão mole! Ele seguiria pela parte mais suja e molhada da via. Tinha ficado com essa parte “boa”, mas amigo, também é para essas coisas!!!! Além disso, só tínhamos 4 grampos para terminar a via! Tinha que dar um jeito! Amigo é ... Ninguém estava a fim de voltar rapelando e subir a trilha de volta.

    Assim foi o relato da conquista da terceira enfiada, feita pelo Guilherme:

    [​IMG]“Mais uma via e mais uma conquista. A minha primeira com tecnologia! Pois o paredão que conquistara anteriormente levou 2 dias para bater 4 grampos! Furadeira de última geração super leve e fura muito rápido, cruzada com uma fita no peito e toca para cima. Antes disso estava ansioso para mostrar a minha sapatilha ao Leandro, TOP ( via de 7° vira 5° hehehe), trilha de 30 min e chegamos na praia. Base da bela linha no Morro das Andorinhas, em 1min Leandro equipadaço. Perguntei: - Nem preciso perguntar se quer guiar o primeiro lance? Não é? Leandro riu, e logo depois armei a segurança dele. Cadê a minha sapatilha? P... ferrou! Logo me antecipei. - Participo de tênis mesmo (com cara de choro). Ary riu e Leandro seguiu.

    Toma- lhe diagonal, escalei com muita dificuldade e claro com a corda super justa. Óbvio que escorreguei e caí várias vezes, o que foi tema de divertimento dos outros dois guias (vídeo cassetadas). A segunda enfiada guiada por Ary então... escorreguei muito. Na terceira enfiada, lembrando que cada esticada tinha aproximadamente 55m, faltava mais uma ou duas enfiadas, e tínhamos só 4 grampos. Nosso amigo Leandro manda a letra: - E aí Reginaldo? Vai? Meu sobrenome é Reginaldo e é engraçado, sei disso! Respondi: - Agora! Kmon! Subi cheio de gana pois agora sim a pedra estava firme, porém...ah porém, deveria conquistar super exposto, lembrei dos 4 grampos no boudrier. Aí o coração acelerou! O primeiro foi bem perto da parada, escolha minha, para que o escalador não perdesse o grampo de vista. Ary e Leandro gritavam: sobe mais... E toma diagonal.

    No segundo grampo, procurei me distanciar mais, porém ao passar no meio de muitas bromélias, estava molhado. Lance tenso demais. Escorreguei feio e caí de cara na pedra, ralei o braço, mas não desci nenhum centímetro. A tensão era tanta, que fiquei pendurado por uma mini agarra e bromélias prestes a soltar. Levantei trêmulo e irritado, olhei para trás e só via Leandro na atividade na segurança (rindo muito e esperto, o que nada adiantaria pois a exposição era tanta que acho que cairia na água rsrs). Ary alertou que eu deveria entrar bromélias e mato a dentro. Foi o que fiz, cansado de diagonal e só 2 grampos toquei verticalmente.

    Achei um platô e coloquei o penúltimo grampo. Faltava uns 10m para o cume, e depois desse grampo o lance mais sinistro da via, um provável VIsup niteroiense, 7a do Rio. Escalei, ensaiei, desescalei e nada, vocês não estão entendendo, não tinha agarra! Cansado, ralado e por causa das bromélias molhado (sapatilha do Leandro também). Gritei para o Ary: - Tá f...! Ele disse: - Se prende aí que vou subir. O cara subiu, e comentou que tava difícil a via. Eu disse: Ah malandro, falou "para carai"! Quero ver subir esse lance aqui! Tensooo! Ary: - Deixa comigo, subo o Leandro (de tênis), depois venço isso aê! Esse foi o lance mais engraçado, ver o do Carmo sambando na rocha e chegou cansado na parada. Leandro: P... amigo é pra essas coisas. Feito o nome da via. Dito e feito, Ary com tecnique boa, venceu o lance e pôs o último grampo. Fez o cume e segurança na árvore. Subi, tentando não roubar no lance, venci, roubando! E fiz segurança do Leandro que subiu sambando com o meu tênis. Afinal amigo é para essas coisas!”

    Enquanto o Guilherme conquistava, conforme o relato acima, ficamos preocupados se os grampos dariam. A cada parada e barulho de marretada, perguntava para o Ary: Será que vai dar para fazer cume? Tinha uma parte bonita e limpa, parecia bem íngreme, talvez o crux. Tentamos falar com o Guilherme para proteger numa árvore, mas ele não ouviu. Como a corda já estava quase no fim, o Guilherme colocou o 10º grampo e fez a parada ali. Subi por último e de tênis. Um perrengue... Mas cheguei, escorregando, mas cheguei!

    Estávamos num platô, em uma parada bem confortável, de frente para um lance bem vertical, de uns 10 a 15 metros, sem agarras e com apenas um grampo para bater. Tinha uma barriga mais acima que não tínhamos idéia do encontraríamos depois. Foi arriscar! Como o Ary já estava pronto, resolveu seguir.

    continua....
     
  2. Rocha

    Rocha Moderator Moderador

    Esse foi o relato do Ary, na conquista da última enfiada:

    “No final ainda fiz aquele restinho da via que deve ser um 6ºsup ou VIIa na saída dele e gastei o último grampo na parte mais vertical, depois fiz o resto naquela aderência e faltou colocar o grampo no final da via porque não tínhamos mais grampos para colocar. Tive que dar segurança numa árvore que encontrei no final, já no começo da mata.”

    [​IMG]
    Depois que o Ary e o Guilherme subiram, foi minha vez. Novamente de tênis. Só que agora num lance bem mais difícil. Sem agarra, sem apoio, sem nada, ah! Tinha pelo menos uma coisa: a mochila pesada!!! A solução: fui igual ao Batman!!! Subi rapidinho e cheguei no meio de um capinzal. Pensei na hora: varar esse mato vai ser f.... Votar para rapelar, missão impossível! Não tinha mais como desistir. Guardei o último gole de água, liguei meu GPS natural e seguimos. Mas nem foi muito ruim assim. Só teve mato e arranha gato no começo. Depois ficou um pouco aberto e fácil de caminhar. Seguimos uma diagonal para esquerda, até encontrar a trilha principal, aquela que começa a descer até a enseada. Quem não conhece bem o local, pode complicar um pouco, mas nada que assuste.


    Já na trilha, o Guilherme levou as duas cordas, afinal de contas ele está treinando para o Xterra!!! Fomos descendo e pensando no nome para a via. Depois de tantas “ajudas”, resolvemos batizá-la de “Amigo é pra essas coisas”.


    [​IMG]
    Segunda Investida – 10/08/2013


    Participantes: Leandro do Carmo, Leonardo Carmo, Ary Carlos e Marcos Leonardo.

    Depois de termos conquistado a via, faltava alguns ajustes: intermediar alguns lances, duplicar as paradas e achar o melhor caminho para voltar. Era uma boa missão. Afinal de contas repetir a via inteira guiando, seria um grande prazer. Dessa vez, o Guilherme não pôde ir, já tinha um compromisso. Eu e o Ary convidamos o Marcos e o Leonardo para nos acompanhar. Nos encontramos na entrada da trilha e seguimos até ao setor Casa de Pedra.

    [​IMG]
    Na base, nos preparamos e olhei para o primeiro grampo e pensei: “Por que eu coloquei alto???” Mas não tinha jeito, era tocar para cima. O lance inicial é bem tranquilo. Sobe reto e depois segue numa diagonal até a primeira parada. Lá, dupliquei a parada e o Leonardo subiu. Veio rápido e assim que ele chegou, já me preparei para a segunda enfiada. Mais uma diagonal para a direita e cheguei o grampo que antecede um lance mais vertical. Um 3º, com algumas agarras quebrando, já para esquentar! Mais um grampo costurado e fui seguindo para cima. Subi e subi... Quando olhei o próximo grampo, bem acima, vi que já tinha subido bastante. Foi ficando difícil e uma queda ali, não seria nada agradável! Subi mais um pouco e decidi colocar um grampo. O lance estava muito exposto, um E3. Desescalei um pouco, meio no perrengue, quase escorregando e o bati um grampo. Deu um pouco mais de confiança e segui. Um 4sup na aderência, com aquelas pedrinhas que fazem escorregar... Foi prender a respiração e tocar pra cima.


    Costurei mais um grampo e toquei numa diagonal para a direita. Cheguei na parada, a dupliquei e avisei ao Leonardo para subir. Essas três enfiadas já estavam completas! A mochila pesada já começava a incomodar. O calor estava forte e o sol não dava trégua! Lá de cima víamos a galera de caiaque e stand up curtindo um mar bem calmo e com águas claras... Pensei num mergulho... Mas a essa altura.... Só restava um mergulho no meio do mato!

    Um minutinho de descanso e segui novamente. Essa é a parte mais suja da via. Além da sujeira, tem algumas bromélias que dificultam a visualização dos grampos, que por sinal são apenas 2 antes da parada. Para não perdê-los de vista, basta seguir numa diagonal para a direita, se guiando por um arbusto bem longe, abaixo de um platô, não tem erro! E assim fui escalando. Costurei o primeiro grampo, o segundo e tome diagonal. Um lance um pouco exposto, mas bem tranquilo, até chegar ao platô onde temos a terceira parada. Lá, também foi duplicada. Agora, esperaria o Ary subir, para que agente pensasse como intermediar o próximo lance, pois era o crux da via.

    [​IMG]
    Com todos reunidos numa parada bem confortável, com exceção do sol que já incomodava, comentei com o Ary o motivo pelo qual coloquei um grampo antes do lance em aderência, ele concordou que estava exposto demais e lembrou de como foi para conquistar o lance... Decidi ir pouco mais para o lado direito para tentar um variante. Até fiz o lance, mas decidimos não grampear outro caminho. Resolvemos bater o grampo um pouco mais acima da parada, assim daria para fazer em artificial, caso não alguém não conseguisse fazer em livre.


    A saída é bem técnica, poucas agarras de mão e poucas para pé. Talvez um VII. Dali, seguimos para cima até o próximo grampo, num platôzinho. A saída também técnica, mas não tão difícil, apesar de ter menos opção. Uma agarra abaixo do grampo e depois o pé bem na esquerda, completa uma passada em IVsup, seguido de um lance em total aderência, mas razoavelmente tranquilo... Cruzamos um matinho, até chegar a uma pequena laje de pedra onde bati o último grampo, montando a última parada. Estava concluída!!! Via Amigo é pra essas coisas, que graduamos em 3º VII(A0) E2 D1 175 m. Uma via interessante, com lances em agarras, aderência, lances mais técnicos e um belo visual! Superou minhas expectativas!

    Agora faltava a segunda parte... Um vara mato! Como já havíamos feito duas semanas antes, o caminho já estava mais ou menos mentalizado. A saída fica a esquerda do grampo, é só seguir reto até uma pedra, passar por cima dela e seguir um pouco para a esquerda, desviando das pequenas árvores, até chegar numa pequena árvore cheia de espinhos. Dali, foi só pegar uma diagonal para a esquerda, até chegar uma grane calha. Descemos até o meio da calha e seguimos reto para cima, depois para viramos para esquerda e chegamos exatamente onde havíamos saída na primeira vez. Bem tranquilo!

    Voltamos pela trilha e paramos para um refrigerante e cerveja numa casa de um morador que abriu, estrategicamente, um ponto de venda!!!


    Valeu pessoal e até a próxima!!!!
     

Compartilhe esta Página